por Luciana Pinsky
– Mãe, como foi quando eu era pequeno, tão pequeno que nem falava ainda?
– O mundo parou.
– Todos queriam me ver?
– Muita gente, sem dúvida. Mas ninguém chegava perto.
– Vocês tinham medo que eu quebrasse por ser beeeeeem pequeno?
– Um pouco isso. E todo mundo usava máscara para se proteger.
– Do frio? Mas todo mundo é friorento como você?
– Mais ou menos. E seu pai e eu ficávamos todo o tempo com você. Não saíamos para nada.
– Eba! Era o dia inteiro brincando comigo?
– Também. Mas, meu filho, os detalhes me fogem. Às vezes parece um sonho longo, daqueles em que a gente desconfia que está sonhando e lá no sonho mesmo diz que é sonho, que vai passar quando acordar. Sabe?
– Como daquela vez que sonhei que tinha ido de pijama para a escola e acordei gritando?
– Parecido. Só que toda a vez que tentávamos acordar, percebíamos que não era sonho não. Deixe-me lembrar. Uh, lavávamos roupa, trocávamos fralda (muitas!), limpávamos a casa, depois limpávamos de novo porque afinal moramos em São Paulo e a sujeira nunca dorme. Aliás, por falar em dormir, de vez em quando dormíamos umas horas. Cozinhávamos, colocávamos você para dormir. E aí, tudo de novo e sempre.
– Vocês não trabalhavam?
– Sim, de casa, entre um aspirador de pó e uma troca de fralda. É, acho que não esqueci nada.
– Esqueceu sim: aposto que você e o papai maratonaram nas Olimpíadas. Viram aqueles esportes estranhos com regras esquisitas.
– Adoraria. Mas não teve Olimpíadas.
– Como assim? Nasci em ano de Olimpíadas.
– Eu não disse que o mundo parou?
– Nossa, sou mesmo importante!